“Então, Jesus, no poder do Espírito, regressou para a Galiléia, e a sua
fama correu por toda a circunvizinhança.
E ensinava nas sinagogas...” (Lucas 4.14-15a)
A temática do crescente “movimento
dos desigrejados” muito desperta meu interesse. Há não muito tempo, tive uma
conversa com um amigo cristão, de profundas convicções e que parece ser um
genuíno seguidor de Jesus Cristo, o qual defendia emblematicamente que o grande
problema do cristianismo hoje é a institucionalização da fé, a existência da “Instituição”,
ou seja, da estrutura eclesiástica que foi criada ao redor da fé cristã. E nós
discutimos bastante a respeito desse assunto. E, ainda que eu concorde com ele
em muitos pontos, no sentido dos muitos problemas que essa institucionalização,
a criação dessa estrutura eclesiástica, o surgimento da “religião” como uma
estrutura fechada com suas regras de variados aspectos traz, não posso
concordar que a “Instituição” é a causa do problema ou o problema em si mesmo.
E esse texto de Lucas me faz pensar sobre isso.
Nós conhecemos os textos bíblicos
e os Evangelhos e sabemos quantas e quantas vezes Jesus emitiu palavras severas,
críticas duras aos líderes da “religião judaica estabelecida” – os doutores da
lei, os fariseus, os próprios sacerdotes. E sabemos como que os grandes pecados
deles estavam em ter focado tanto na religião,
a ponto de perder a fé e a prática da
genuína vida espiritual. Eles estavam
tão preocupados e ocupados com o “cumprimento
da lei”, a ponto de perderem de vista o significado
da lei. Deixaram de ser povo de Deus,
para tornarem-se religiosos. Sua
religião tornou-se mais importante do que o próprio Deus. E essa foi a grande
crítica de Jesus a essas pessoas – os religiosos. E ainda é assim em nossos
dias. Tantas pessoas que estão mais preocupadas com a manutenção dos dogmas e
costumes de sua religião, ou com a popularidade e o crescimento de seu grupo
religioso, do que com a vontade do próprio Deus. E, então, temos visto coisas
absurdas acontecendo em nossa realidade brasileira.
Contudo, basta lermos com atenção
os evangelhos e veremos, repetidamente, os relatos de Jesus exercendo o seu
ministério NAS SINAGOGAS. E não apenas Jesus, mas os discípulos também. E,
certamente, não é que Jesus ou os discípulos não tinham consciência a respeito
das práticas totalmente erradas que aconteciam ali – Jesus mesmo precisou
expulsar aqueles que transformavam o Templo em mercado. Eles viviam apontando
os erros da religião. Porém, ainda assim, em nenhum momento Jesus ou os
discípulos condenaram a existência da estrutura eclesiástica ou contraindicaram
o exercício da fé dentro dessas estruturas. Não. Ao invés disso, eles SE
APROVEITAVAM dessa estrutura, dessa centralização, da presença das pessoas
reunidas na sinagoga, no sábado, para exercer seus ministérios. Sabendo de
todos os pecados que eram cometidos dentro dessa estrutura, eles poderiam,
simplesmente, ter se recusado a estar presentes nas sinagogas – os locais
usados pelos sacerdotes, fariseus, doutores da lei para propagar seus falsos
ensinos. Mas não. Eu entendo que eles foram sábios.
O versículo 16 de Lucas 4 fala
que: “Indo para Nazaré, onde fora criado,
entrou [Jesus], num sábado, na sinagoga, segundo
o seu costume, e levantou-se para
ler”. E, aqui, eu gostaria de destacar duas coisas: primeiro, ir à
sinagoga, NO SÁBADO, participar das práticas religiosas daquele povo não era
apenas “uma última estratégia” de Jesus – era seu costume!; e, segundo, Jesus
não chegou na sinagoga querendo cancelar as práticas rotineiras daquele serviço
religioso, inventando uma nova metodologia para superar as metodologias usadas
por aquele povo. Não. Ele apoderou-se do modelo de serviço religioso daquele
próprio meio: levantou-se para ler. O
verso 20 diz: “Tendo fechado o livro,
devolveu-o ao assistente e sentou-se; e todos na sinagoga tinham os olhos fitos
nele. Então, Jesus passou a dizer-lhes...”. Que narração fantástica! Porque
Jesus seguiu exatamente os costumes de “culto” daquela comunidade religiosa.
Ele não precisou chegar lá e mudar tudo para exercer seu ministério. Ele usou
de seu direito, enquanto judeu, de ir ao encontro semanal na sinagoga, de
levantar-se para ler e de explicar o texto que havia lido, para propagar suas
verdades e anunciar as boas-novas no meio daquele povo. E poderíamos coletar uma
quantidade enorme de textos dos evangelhos que narram essa mesma prática –
tanto de Jesus quanto dos discípulos/apóstolos.
Nós não precisamos destruir toda
a estrutura para realizar uma reforma efetiva nas coisas que estão erradas
dentro de nossos meios religiosos. Sim, existem muitos erros dentro de nossas
estruturas. Sim, existe muita religião vazia de Deus. Sim, existem muitos fariseus
e sacerdotes e doutores da lei condenáveis em nosso meio evangélico brasileiro.
Porém, a culpa não é da existência de uma “organização eclesiástica”, ou “institucionalização”.
Não foi na “existência da sinagoga e seus costumes” que Jesus colocou a culpa.
Não foi a isso que Ele condenou. Foi às pessoas! Elas são o problema! Nós somos
o problema! Não as nossas “igrejas”. Derrubar todas as “igrejas” (entenda-se “templos”)
do Brasil não resolveria o problema do cristianismo brasileiro, assim como
derrubar as sinagogas não resolveria o problema dos judeus daquele tempo.
Desfazer todos os conselhos e diretorias e demais estruturas administrativas de
nossas “igrejas” não resolveria o problema de nosso cristianismo. Acabar com
todos os regulamentos, grupos organizacionais, etc, não resolveria nosso
problema. Porque o problema está EM NÓS! No ser humano! E, enquanto houver
seres humanos compondo a IGREJA de Jesus Cristo, haverá problemas a serem corrigidos.
E enquanto houver seres humanos NÃO REGENERADOS fingindo ser IGREJA de Jesus
Cristo, haverá falsas profecias e pecados inimagináveis!
Nossas igrejas-instituições serão
aquilo que fizermos delas. Podemos usá-las a nosso favor, com sabedoria, como
Jesus e os discípulos faziam, aproveitando de suas estruturas para alcançar o
povo de Deus e anunciar a eles as verdades das Escrituras, ou podemos nos
tornar “inimigos” delas (e, de algum modo, das pessoas ali presentes), e nunca
alcançar aquelas vidas que escolheram ali estar, e simplesmente abandoná-las. É
óbvio que não PRECISAMOS exercer nosso ministério e chamado cristão dentro da
estrutura eclesiástica. Não. Porém, que não seja porque resolvemos que esse não
é o ambiente adequado. Jesus o julgou adequado para desenvolver seu ministério.
Seus primeiros discípulos também – e ainda dentro das sinagogas, mesmo sabendo
que sua fé não era mais centrada nas sinagogas. Por que eles assim o julgaram? Uso
as palavras de Paulo: “Fiz-me tudo para
todos, para por todos os meios chegar a salvar alguns” (1 Coríntios 9:22).
Porque o foco deles era as pessoas. Não era eles mesmos ou aquilo que mais os
fazia felizes ou satisfeitos. Eles tinham uma missão a cumprir: anunciar as
verdades de Deus para a salvação dos perdidos e a glória de Deus. Então, tudo
aquilo que pudesse ser usado no cumprimento dessa missão, era bem-vindo. Era
nas sinagogas que elas estavam? Era ali que eles iriam. Era nas praças? Ali
eles estariam. Era nas casas? Então era esse seu destino. Cumprir o chamado.
Viver a missão.
Que Deus nos ajude a lidar com
todos os erros, dos mais leves aos mais graves, que temos visto acontecendo
dentro de nossas igrejas-instituições, dentro da “religião” cristã. Que
tenhamos a iluminação do Espírito Santo para reconhece-los onde eles estiverem
ocorrendo. Mas que recebamos, dEle, também a sabedoria e o discernimento para
saber como agir. A quem combater. A ajuda do Espírito Santo para reconhecermos
contra quem é a nossa luta. Que Ele nos ajude a lembrar que “nossa luta não é contra o sangue e a carne,
e sim contra os principados e potestades, contra os dominadores deste mundo
tenebroso, contra as forças espirituais do mal, nas regiões celestes”
(Efésios 6.12). E que lembremos também que, até que a colheita final aconteça,
haverá joio crescendo junto ao trigo. E que não será possível separá-los
completamente até que a grande colheita chegue, pois iria-se destruir o trigo
juntamente com o joio se tentássemos fazê-lo. Portanto, é de sabedoria que
precisamos, para combater o joio antes que a colheita chegue, mesmo sabendo que
não será possível arrancá-lo completamente do meio da plantação.
Que o Espírito Santo sonde as
motivações por trás de nossa luta contra o que quer que seja, e nos molde e
transforme, para que o cumprimento de nossa missão e o amor a Deus e ao próximo
sejam, acima de todas as coisas, nossa grande bandeira e nosso caminho a
seguir. Para a glória do Único Digno e para o crescimento de SUA IGREJA. Amém.
2 comentários:
Acho que sou meio como esse teu amigo aí! hahaha Só que não consegui sair da igreja. Tens uns dias que são bem difíceis, mas eu vou tentando.
Eu sei quanto isso é difícil, Pri. Sei mesmo. Tenho tantos amigos passando por essa luta. A desilusão com a "igreja". Vemos tanta coisa errada. Tanta vaidade, disputa de cargos, etc. Realmente revolta, frustra, cansa. Fiquei pensando, e deve ser mais ou menos como a borboleta que já está quase pronta pra bater asas e voar, depois de ter vencido seu longo caminho como lagarta, mas ainda precisa estar presa no casulo. Aquele casulo tornou-se pequeno demais pra ela. Mas ainda é tempo de permanecer lá. Por enquanto. Mas logo logo chegará o tempo de alcançar as alturas dos céus e viver plenamente sua liberdade. Nosso tempo chegará em breve. Mas a culpa não é do casulo. Não nos revoltemos contra ele. E, no fim, que ainda possamos lembrar de quanto ele nos ajudou em nosso tempo de transformação, e quanto todas as borboletas precisam dele, por mais simples que ele seja. Que, quando nossas asas tornarem-se grandes demais, não esqueçamos todos os benefícios que ele já nos trouxe um dia. E possamos ser gratos. E amar os que ainda têm necessidade dele. E amar. Fim.
[P.S: Adoro te ter aqui! xD]
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