“Então, as multidões o interrogavam, dizendo: Que havemos, pois, de
fazer?” (Lucas 3.10)
Eis a pergunta mais importante da
vida do ser humano. E agora, o que nós devemos fazer? No texto de Lucas 3.1-14,
o evangelista expõe o ministério de João Batista e, no verso 7, diz que João se
dirigiu às multidões que o procuravam para serem batizadas e lhes disse: “Raça de víboras, quem vos induziu a fugir da
ira vindoura?”. E, se pararmos para refletir seriamente sobre o que João
estava falando, que coisa tão dura de se falar! O texto diz que aquelas pessoas
estavam INDO ATRÁS do Batismo de João. E nós sabemos qual era a pregação de
João Batista em seu ministério, conforme falam os evangelhos de Mateus e
Marcos: “Naqueles dias, apareceu João
Batista pregando no deserto da Judéia e dizia: Arrependei-vos, porque está
próximo o reino dos céus” (Mateus 3.1-2) e “apareceu João Batista no deserto, pregando batismo de arrependimento
para remissão de pecados” (Marcos 1.4). João andava por toda a vizinhança
do Jordão pregando ARREPENDIMENTO e BATISMO DE ARREPENDIMENTO, para remissão
dos pecados. O batismo era o que ele ensinava. Ele conclamava as pessoas a se
arrependerem e virem batizar-se. Porém, Lucas nos diz que havia uma multidão
que vinha para ser batizada, porém, João a chama de raça de víboras e a condena
por tentarem fugir da ira vindoura! Isso não seria completamente contrário ao
que ele pregava? Ele pregava sobre remissão dos pecados, para que as pessoas
fossem livres da ira vindoura, contudo condenava aquelas pessoas porque estavam
tentando fugir desta mesma ira, por meio do batismo que ele oferecia.
Só que não existe contradição
aqui. Eu acho tão bonito o que Lucas resolveu registrar em seu evangelho a
respeito da pregação de João. Os demais evangelhos falam muito sucintamente a
respeito do que Lucas fala aqui. Logo após mencionar a repreensão que João faz
àquela multidão, o texto continua dizendo: “Produzi,
pois, frutos dignos de arrependimento” (v.8a). E é preciso parar para
analisar muito bem o que essas palavras significam. Talvez alguém queira
usá-las para defender que a salvação depende dos frutos que damos, que o
arrependimento segue os frutos, os quais precisamos gerar primeiro. Porém, não
é o que o texto diz. João não se contradiz aqui, como se a salvação dependesse
dos nossos frutos e não do nosso arrependimento. O que ele está dizendo é que o
verdadeiro arrependimento não pode
vir separado de frutos. Frutos dignos de arrependimento. A versão King James
diz: “Produzi, então, frutos que
demonstrem arrependimento” (v.8a). João via, na vida daquela multidão que o
procurava, que não havia verdadeiro arrependimento. Era somente pelo medo da
ira vindoura que eles procuravam batizar-se. Mas não haviam se arrependido de
seus pecados. E foi por isso que João os repreendeu. O batismo de João não era
para essas pessoas.
E minha pergunta é: será que as
pessoas, em nossos dias, têm compreendido o que é o verdadeiro arrependimento?
Será que temos conseguido ensinar o que João estava ensinando: que a salvação
não é pelas obras, e sim a partir do arrependimento dos pecados, porém que não
existe arrependimento real se não houver mudança de obras? Será que nós mesmos
temos entendido a relação que existe entre essas duas coisas? É belíssimo como
Lucas escolheu o restante das palavras de João Batista para registrar nesse
texto e deixar bem claro o que estava sendo ensinado. As multidões, após serem
exortadas, perguntam, então, a João: “Que havemos, pois, de fazer?” (v.10 –
ARA), ou, segundo a versão King James, “O que devemos fazer então?”. Aquelas
pessoas, definitivamente, não haviam entendido a pregação de João. E ele,
então, explica a eles:
“Quem tiver duas túnicas, reparta com quem não tem; e quem tiver
comida, faça o mesmo. [...] Não cobreis mais do que o estipulado. [...] A
ninguém maltrateis, não deis denúncia falsa e contentai-vos com o vosso soldo”
(v. 11, 13, 14)
É interessante que Lucas não se
restringiu a registrar o que os outros evangelistas registraram: o “arrependei-vos”
de João. Ele vai além. Ele explica o que quer dizer esse “arrependei-vos”.
Significa MUDANÇA. É o significado dessa palavra tão batida e mal empregada nos
nossos dias: “CONVERSÃO”. O que significa conversão? Significa isso aí que João
falou àquela multidão. O que significa o verdadeiro arrependimento? Significa
conversão. Conversão é uma palavra que significa, literalmente, mudança de direção. Aquele que vivia somente
para si mesmo, que passe a ser misericordioso com o outro e o ajude. Aquele que
era avarento e mentiroso, seja honesto. Aquele que queria o mal do outro e se
aproveitava de sua posição para, por meio da exploração alheia, se beneficiar,
deixe de fazê-lo. MUDE. E quando você mudar, isso não GERARÁ arrependimento em
você. Isso apenas DEMONSTRARÁ que o verdadeiro arrependimento aconteceu. Você
entendeu. Você reconheceu-se errado, pecador, e a compreensão de seu pecado
pesou tanto sobre você que você não poderia mais continuar na mesma direção, no
mesmo caminho, nas mesmas obras. A única coisa que poderia acontecer era
CONVERGIR, sair daquele caminho e voltar na direção oposta.
Me preocupa tanto a realidade que
nosso Brasil e, talvez, uma boa parte do Ocidente vive hoje em relação ao
Cristianismo. A mensagem cristã se banalizou. Falou-se tanto, talvez sem
entender o verdadeiro sentido dos ensinos das Escrituras, talvez com a
motivação errada de arrebanhar ovelhas para nosso pasto, talvez sem nem mesmo
os pregadores terem se tornado verdadeiras ovelhas deste pasto, que a mensagem
foi banalizada. Podemos perguntar para todas as pessoas ao nosso redor se elas creem
em Deus, e a grande maioria afirmará que sim. Perguntemos a elas se elas são
filhas de Deus, e elas dirão que sim. Perguntemos a elas se elas são cristãs, e
elas responderão que sim. Como aquela multidão dizia ser filha de Abraão, filha
da promessa de Deus. No entanto, João diz a elas: “e não comeceis a dizer entre vós mesmos: Temos por pai a Abraão; porque
eu vos afirmo que destas pedras Deus pode suscitar filhos a Abraão” (v.8b).
Filhos como vocês? Até mesmo essas pedras podem ser. Vocês não são filhos!
Vocês sequer entendem o que é ser um filho de Abraão. E sabemos disso ao olhar
para as suas vidas! É assim no nosso mundo hoje. Os pregadores dizem: “Tenham
fé em Jesus e vocês serão salvos!”. E todos dizem ter fé, sem nem saber o que é
a verdadeira fé salvadora. Os pregadores dizem: “Todo aquele que crer será
salvo!”. E todos dizem crer, porém sem ter a menor ideia do que significa crer
para ser salvo. João havia pregado: “Arrependei-vos, pois está próximo o reino
dos céus”. E todos diziam terem se arrependido, somente para não provarem do
juízo que acompanhava a chegada do Reino do Senhor dos Exércitos. Sem a correta
explicação do que todas essas palavras tão simples, mas tão decisivas, significam
– “crer”, “fé”, “arrepender-se” – mais contribuiremos para condenação do que
para salvação.
João poderia ter, simplesmente,
fingido que não via a contradição na vida daquelas pessoas. Era uma MULTIDÃO
procurando-o para ser batizada. Ele poderia dizer, como muitos dizem hoje: “Quem
sou eu para dizer que o arrependimento deles não é verdadeiro? Se eles estão
afirmando terem se arrependido e desejam ser batizados, então quem sou eu para
não batizá-los?”. Mas não. João sabia qual era seu papel. O último profeta. E
que se ele se omitisse em deixar suficientemente claro o significado de sua
pregação, não completaria a sua missão de preparar o caminho para o Senhor
Jesus. João foi levantado por Deus para preparar o caminho para a primeira
vinda do Messias. Nós somos aqueles que Deus chama para preparar o caminho para
Sua segunda vinda, que se aproxima, como nos tempos do Batista. E, como o
Batista, não podemos comprometer nossa mensagem. Que ela esteja clara para nós –
e que ela seja viva e real em nós. Que possamos examinar a nós mesmos para
saber se temos experimentado o verdadeiro arrependimento e a verdadeira
conversão. E, tendo provado a nós mesmos, que o Senhor nos capacite a ensinar a
este mundo a verdade completa – ainda que seja uma palavra dura aos que a
ouvem.
Aquela multidão que perguntou a
João “Que havemos, pois, de fazer?”, e que não havia experimentado verdadeiro
arrependimento, provavelmente não gostou muito das respostas que ele deu.
Aquelas pessoas egoístas, provavelmente não gostaram de ouvir que precisavam
tornar-se misericordiosas. Aqueles publicanos que usavam de seus postos para
tirar mais dinheiro do que deviam dos outros, e enriquecer às suas custas,
provavelmente não gostaram de ouvir que deveriam parar de cobrar o que não era
devido. Aqueles soldados, acostumados a maltratar os outros por prazer, a usar
de sua autoridade para humilhar aos outros e se beneficiar às custas dos
outros, provavelmente não gostaram de ouvir que deveriam parar de maltratar, de
fazer denúncias falsas e deveriam se contentar com seu salário. O que João fez
foi mostrar-lhes que eles não queriam, de fato, abrir mão de seus pecados.
Portanto, não havia neles arrependimento. E pregar isso é duro. Dizer a alguém
que se ela não deixa suas práticas pecaminosas, então sua fé é vã, então ela
não crê em Deus, e então ela não é Sua filha. Ela está se autoenganando. E
então, ela não está preparada para receber o batismo de arrependimento. E então
ela não está preparada para entrar para a família da fé. E não é fácil pregar
isso. Mas é preciso.
Que o Senhor nos conceda coragem,
mas também amor e sabedoria, para aprender como fazer isso, como ser os
proclamadores das verdades completas do evangelho. Que não sejamos acusadores
duros e implacáveis que se colocam como juízes e vivem para apontar o pecado
alheio. Mas que não sejamos também medrosos e mais interessados em agradar ao
homem do que a revelar-lhe os ensinos das Escrituras. Que o Espírito Santo nos
ajude a encontrar o equilíbrio. E que nada do que façamos seja feito sem amor,
pois “sem amor, nada disso me
aproveitaria” (1 Coríntios 13.3b). Que Ele nos ajude a assim ser. Para Sua
glória. Amém.
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