“[...] porque, onde está o vosso
tesouro, aí estará também o vosso coração” (Lucas 12.34)
O texto de Lucas 12, versos 1 a
34, fala de um assunto só: o verdadeiro sentido da vida. E eu só percebi isso
quando já estava chegando lá pelo verso 22. Aí acontecem aqueles momentos de
iluminação de Deus. É tudo sobre a mesma coisa.
O texto começa com Jesus
alertando seus discípulos e a multidão reunida contra o fermento dos fariseus:
a hipocrisia. Hipocrisia que se revelava na vida cheia de coisas ocultas que
eles tinham, das máscaras que eles usavam. Mas Jesus adverte a todos que nossa
verdadeira face nunca poderá ficar escondida para sempre. Nossas máscaras
cairão, nossas coisas escondidas serão reveladas. Portanto, que não haja em
nossa vida este fermento de hipocrisia que havia nas vidas dos escribas e
fariseus, com quem Jesus acabara de conversar e de a quem acabara de
repreender, no fim do capítulo 11. E a hipocrisia deles consistia em uma coisa:
dizerem-se preocupados com as coisas espirituais, com suas máscaras
espirituais, porém com os olhos e o coração fixos em si mesmos e nas coisas
deste mundo. Diziam-se espirituais, mas eram carnais. E, então, Jesus mostra
três comportamentos que revelam quando nosso coração está nas coisas deste
mundo e não nas coisas espirituais, e quais deveriam ser nossas verdadeiras
preocupados – o que realmente importa.
1) Medo da morte (Lucas 12.4-12)
“Digo-vos, pois, amigos meus: não
temais os que matam o corpo e, depois disso, nada mais podem fazer” (v.4).
Infelizmente, raramente paramos
para pensar por que certas coisas da vida geram tanta preocupação, tanto medo
em nós. Por que tememos tanto a morte? Mesmo que não assumamos. Nós a tememos.
Pensamos, caso somos convidados a realizar uma ação cristã em um local perigoso
da cidade: “Mas será que devemos mesmo ir lá? Será que é seguro?”. Se somos
convidados para um trabalho missionário em um país em guerra: “Mas não é melhor
ir a outro lugar?”. Se somos desafiados a desenvolver qualquer atividade que
possa nos trazer dor ou mesmo qualquer tipo de desconforto, até mesmo o
emocional, logo desanimamos. Tenho ouvido tantos cristãos preocupados com o
risco de extremistas islâmicos se aproveitarem dessa onda de migração de
refugiados Sírios e de outras áreas do Oriente Médio, e da abertura que o
Brasil tem dado, liberando as fronteiras e facilitando a entrada destes refugiados.
E a preocupação sempre é: “nós não sabemos o que eles podem fazer. Daqui a
pouco estarão realizando atentados terroristas aqui no Brasil, perseguindo a
Igreja, e nós estaremos correndo riscos”. E isso tem gerado tanta preocupação a
tantas pessoas, nestes tempos. Mas, por que isso nos amedronta tanto? Por que o
risco de sermos perseguidos, de sofrermos um atentado, de sofrermos danos
físicos nos causam tanto alarme? E a verdade é que é porque nossas preocupações
estão neste mundo, e não na eternidade. No mundo físico, e não no espiritual.
Em nós mesmos, e não em Deus. E é por isso que tememos tanto aqueles que podem
matar o corpo, mesmo sem poder fazer dano nenhum a nosso espírito. Porque
colocamos valor maior no corpo do que no espírito. E é com ele que nos
preocupamos, acima de todas as coisas. Por isso, o medo da morte chega a
paralisar certas pessoas. Por isso há pessoas (mesmo cristãs) que, quando ouvem
alguém dizendo “Se eu morrer amanhã, encontro você lá no céu!”, rapidamente
respondem: “Credo! Tá amarrado! Ninguém vai morrer não! Para com isso!”. Porque
criamos raízes neste mundo e não queremos deixa-lo. Nós o transformamos em
nosso tesouro, nos esquecendo que este corpo perecerá, e este mundo também. Que
a verdadeira realidade está além deste corpo físico.
E o ensino de Jesus sobre isso é:
“temei aquele que, depois de matar, tem poder para lançar no inferno. Sim,
digo-vos, a esse deveis temer.” (v.5). Deus. É a Ele que devemos temer. Ao que
acontecerá com nossos espíritos APÓS a nossa morte física. Isso sim é realmente
importante. Ao olharmos para todas essas situações arriscadas e difíceis para
nós mesmos, que nossa preocupação não esteja em “O que acontecerá comigo?”, mas
“De que forma isso pode influenciar realidades espirituais?”. Na minha vida e
na vida dos demais envolvidos. Como isso pode beneficiar ou prejudicar,
espiritualmente, a Igreja de Jesus Cristo, nossa fé, nosso crescimento, nossa
aproximação de Deus, e todos aqueles que ainda precisam conhecer a Jesus.
Porque estas coisas influenciarão para a vida eterna. E é com elas que devemos
nos preocupar.
2) Avareza (Lucas 12.13-21)
“Então, direi à minha alma: tens
em depósito muitos bens para muitos anos; descansa, come, bebe e regala-te. Mas
Deus lhe disse: Louco...” (v. 19-20a)
Nós podemos até não perceber
também, mas todos pensamos nisso. Precisamos de um fundo de aposentadoria.
Precisamos de uma poupança. Precisamos de uma casa melhor. Precisamos de um
carro novo. Precisamos de mais roupas. Precisamos de mais sapatos. Precisamos
de mais lazer. Precisamos de mais um trabalho. Precisamos de tantas, tantas,
tantas coisas. Precisamos derrubar nossos celeiros, para podermos construir
outros que possam abarcar os tesouros que temos conseguido juntar. E, então –
só então - , quando tivermos conseguido juntar o suficiente, descansaremos e
seremos felizes. Essa é a filosofia da grande maioria das pessoas hoje em dia.
Nossos pais nos ensinam. Nós, que somos jovens, precisamos ralar muito e
trabalhar muito agora, enquanto temos forças e energias, para que, um dia,
possamos nos aposentar e usufruir dos bens que acumulamos. Só acontece que
juntar bens toma nosso tempo, nossas forças, nossas atenções, nossos
planejamentos... tudo o que somos. E, então, quando vemos, em nossa corrida
para entesourar para nós mesmos, quase nada sobrou para Deus. Para a minha
poupança, nunca pode faltar. Mas para ajudar um necessitado, sempre falta. Para
apoiar um missionário, sempre falta. Para investir nos trabalhos da igreja,
sempre falta. Mas para minha calça jeans nova, a gente dá um jeitinho. Para o
cinema do fim de semana, a gente dá um jeitinho. Para minha maquiagem nova,
minhas unhas semanais, meu cabelo... a gente arruma.
“Mas Deus lhe disse: Louco, esta
noite te pedirão a tua alma; e o que tens preparado, para quem será? Assim é o
que entesoura para si mesmo e não é rico para com Deus” (v.20-21). Temos
tempo para nós mesmos, mas não temos para Deus. Temos energia para nosso
trabalho, que nos permite juntar tesouro para nós mesmos, mas não temos para
nossa família, nossos amigos, os que precisam de nós, e o próprio Deus. Mas
essa vida terminará. De repente. Quando menos esperarmos. E o que terá valido
serão os tesouros que acumulamos para com Deus. Nosso amor, nossa misericórdia,
nossa compaixão, nossa doação, nossa liberalidade para com o Reino de Deus.
Juntar para a eternidade, e não para este mundo perecível.
3) Ansiosa preocupação com as
necessidades dessa vida (Lucas 12.22-33)
“Por isso, eu vos advirto: não
andeis ansiosos pela vossa vida, quanto ao que haveis de comer, nem pelo vosso
corpo, quanto ao que haveis de vestir. Porque a vida é mais do que o alimento,
e o corpo, mais do que as vestes.” (v.22-23)
E é assim que Jesus conclui o Seu
ensino. “Não andem tão ansiosos assim!”. Por que nós andamos tão ansiosos com
nossa vida – nossas necessidades diárias ou futuras? Porque nós nos esquecemos
que esta vida não se resume à realidade material – há uma realidade espiritual,
da qual nós fazemos parte, e, nesta realidade, há um Deus Todo Poderoso que é
nosso Pai e cuida dos Seus filhos. Mas nos esquecemos disso. Passamos a
acreditar que o provedor de nossas vidas somos nós mesmos. Nossos esforços.
Nossos empregos. E, por isso, eles precisam ser nossas prioridades. Por isso
precisamos trabalhar mais um turno, mesmo quando isso prejudica as coisas que
realmente valem à pena nessa vida. Porque acreditamos que nosso sustento vem de
nós mesmos – e não do Senhor. Então, vivemos preocupados com o que haveremos de
comer, de beber, de vestir, etc. Por isso, deixamos de investir no Reino de
Deus. Por isso, deixamos de estar com o Corpo de Cristo, pois precisamos
trabalhar. Por isso, abrimos mão de uma viagem missionária, pois nos custaria
reduzir os custos com a manutenção de nosso estilo de vida – o que não podemos
fazer. Por isso, o campo missionário transcultural é tão apavorante pra tanta
gente ainda. Por isso os pais se desesperam quando seus filhos dizem ser
chamados para o trabalho missionário em campos pobres. Por isso, os jovens são
ensinados a escolher profissões que darão dinheiro, e não as que fazem parte do
chamado de Deus para suas vidas. É assim que fazemos nossas escolhas hoje em
dia. Calculando nossa sobrevivência. E é assim que deixamos Deus de fora da
nossa história – e ficamos de fora da história dEle.
O que Ele nos ensina: “Observai os corvos, os quais não semeiam,
nem ceifam, não têm despensa nem celeiros; todavia, Deus os sustenta. Quanto
mais valeis do que as aves! [...] Observai os lírios; [...] se Deus veste assim
a erva que hoje está no campo e amanhã é lançada no forno, quanto mais
tratando-se de vós, homens de pequena fé! [...] vosso Pai sabe que necessitais
[destas coisas]. Buscai, antes de tudo,
o seu reino, e estas coisas vos serão acrescentadas. Não temais, ó pequenino
rebanho; porque vosso Pai se agradou em dar-vos o seu reino. Vendei os vossos
bens e dai esmola; fazei para vós outros bolsas que não desgastam, tesouro inextinguível
nos céus, onde não chega o ladrão, nem a traça consome, porque, onde está o
vosso tesouro, aí estará também o vosso coração” (v.24, 27a, 28,
30b-34)
Não se trata de não termos mais
cuidado com nossa vida e deixarmos de ser atentos e sábios com nossas escolhas
diárias. Não se trata de não nos precavermos financeiramente e sairmos torrando
nosso dinheiro de qualquer forma, ainda que seja em ações religiosas, sem a
responsabilidade de cumprir com nossos compromissos – pessoais, cidadãos,
familiares. Não se trata de não assumirmos nosso papel em nos empenharmos para conseguir
nosso sustento e ficarmos sentados, esperando Deus mandar o maná do céu. Não é
sobre essas coisas que este texto fala. Não é sobre negligência, preguiça,
irresponsabilidade, falta de compromisso e de responsabilidade, falta de
sabedoria e vida desregrada. Não é sobre uma fé cega. É sobre onde está nosso coração. É sobre onde
está o nosso tesouro. É sobre em que temos investido as nossas vidas. É sobre o
que realmente tem importado para nós. E o que realmente importa para Deus. O
que realmente importa nessa vida. É sobre descobrir isso e investir nisso. Tudo
o que pudermos. É sobre não viver para si mesmo – mas para Deus, e para o
próximo. Pois foi assim que Jesus viveu. E veio nos deixar o exemplo. Ele sabe
o que realmente importa. Aprendamos com Ele.
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