segunda-feira, 21 de março de 2016

Quaresma – Dia 34 – Vocação de Jesus, nossa Vocação



“[...] lembra-te de que recebeste os teus bens em tua vida, e Lázaro igualmente, os males; agora, porém, aqui, ele está consolado; tu, em tormentos” (Lucas 16. 25)

Quanto mais eu leio o Evangelho de Lucas, mas vejo como este ensino de Jesus se repete, vez após vez: Jesus veio para os desprezados deste mundo. Isso é tão claro. Capítulo após capítulo, lá está Jesus e os fariseus opondo-se um ao outro: Jesus aproximando-se dos excluídos, ensinando sobre misericórdia, compaixão e amor; e os fariseus, odiando-O por isso, e nos ensinando sobre orgulho, autojustiça e discriminação. De tudo o que tenho aprendido do estudo deste Evangelho, isso tem se destacado. E, neste domingo, pude perceber ainda mais a profundidade, a extensão, a relevância desse ensino.

Fui visitar uma igreja nesse domingo, onde estava acontecendo o Musical de Páscoa deles, com coral, teatro e dança. Foi lindo. É sempre um privilégio poder VER a história das Boas Novas sendo encenada. Pensar em Jesus como um homem de “carne e osso”, vivendo no meio de homens “de carne e osso”, e imaginá-Lo, por meio daquele homem que O encenava, fazendo todas as coisas que a Bíblia nos diz que Ele fazia. Isso me toca profundamente. Abre minha mente, meus olhos. E senti isso naquele dia. E, particularmente, em um momento da encenação: Jesus reunido com Seus discípulos, alegre, sorridente, e aproximando-se dEle os coxos, os cegos, os endemoninhados... e Jesus aproximando-se de cada um deles com amor, e libertando-os – e, talvez pela primeira vez na vida de algumas daquelas pessoas, AMANDO-OS. Como isso foi profundo pra mim. E entendi que essa era a vocação de Jesus, ou fazia parte de Sua vocação: AMAR. E amar exatamente aqueles que não eram amados – os excluídos, os rejeitados, os desprezados.

A gente, com certeza, não tem ideia de quanto a exclusão de aleijados, endemoninhados, leprosos, doentes, pecadores, etc, era algo forte no tempo e na sociedade em que Jesus viveu. Mas a Lei falava para o povo de Israel separar de seu meio os “impuros”, para não se contaminarem. E o povo transformou essa “separação dos impuros” em exclusão mesmo. E nós não temos como imaginar como se sentiam os leprosos, a mulher do fluxo de sangue, os doentes (que eram considerados pecadores), os samaritanos, os publicanos, as prostitutas, os pobres, etc, no meio daquele povo que se considerava tão santo que não poderia nem se aproximar deles. Não podemos imaginar quanto eles se sentiam impuros, indignos, sujos, lixo naquela sociedade. Porque, provavelmente, eles haviam sido tratados assim durante toda ou quase toda sua vida. E eles também já deviam ter sido convencidos de que eram o que todo mundo afirmava que eles eram.

E aí chega Jesus. Nossa! Isso é tão forte! A gente já tá acostumado com o fato de Jesus se aproximar dessas pessoas, a ponto de não percebermos o significado disso. Mas NINGUÉM se aproximava dessas pessoas. NINGUÉM se importava com elas. Elas eram NINGUÉM. E lá está nosso Mestre: não apenas aproximando-se delas, mas estendendo a mão, tocando, curando, AMANDO. E é por isso que, cada dia mais, eram essas pessoas que se aproximavam de Jesus. Ele quebra todos os protocolos e todos os paradigmas. Descontrói tudo, para, então, reconstruir. Tudo. Estava eu lendo os capítulos 15 em diante do livro de Lucas e percebendo de quantos rejeitados Jesus fala até o capítulo 18: o pecador (representado pelo Filho Pródigo, em Lc. 15.11-32), o pobre (representado por Lázaro, em Lc. 16.19-31), o doente (representado pelos 10 leprosos, de Lc. 17.11-19), o que está fora do nosso círculo religioso (representado pelo publicano, de Lc. 18.9-14), os inúteis (representados pelas crianças, de Lc. 18.15-17), e continua nos capítulos seguintes – o cego de Jericó, Zaqueu. Os desprezados. Até as crianças! Hoje, vivendo numa sociedade que entende seu dever de proteger as crianças, por serem indefesos, não entendemos quanto as crianças eram desprezadas naquela sociedade. Mas muitas sociedades patriarcais, ainda hoje, como no Oriente, ainda as trata assim – não podem contribuir com nada, não tem nada para oferecer, então só tornam-se “alguém” quando crescem e podem participar da “vida da sociedade e da família”. E vem Jesus abraça-las e dizer que para entrar no Reino dEle é preciso receber o Reino como elas.

E, diante de tudo isso, diante do Evangelho lido e visto naquela encenação, entendo que esta é a nossa vocação. Foi para estes que Jesus veio. De tantas formas, a Sua Palavra tenta nos mostrar isso. Foi para os pequenos, os invisíveis, os que são “nada” que Ele olhou. E é para eles que devemos olhar também. Eu olhava para aquele homem, encenando Jesus, curando aquelas pessoas com um sorriso no rosto, e pensava: eu quero ser isso neste mundo também! Quero ser aquela que irá olhar para aqueles a quem ninguém olha, aqueles que se acham ninguém, aqueles que não tem mais esperança, os rejeitados, os sem voz, os esquecidos... quero ser Jesus para eles. Quero fazê-los saber que Deus se importa com eles, que Jesus veio ao mundo para eles e que Ele tem vida nova, plena, eterna para lhes oferecer. Que Jesus tem identidade e propósito para suas vidas. Que eles são importantes, são especiais, são amados por Deus – e que Ele nunca os esquece. Quero ser a presença viva e palpável de Deus nas vidas dessas pessoas. Ir àqueles a quem ninguém vai. Levar amor aonde não existe amor. A vocação de Jesus como minha vocação. A vocação de amar – aqueles que já nem acreditam mais em amor.


Vocação de Jesus, nossa vocação. E que nossas vidas possam ser como a vida do nosso Mestre. Sua missão, nossa missão. Seu chamado, nosso chamado. Sua vida, nossa vida. Que seja assim. Que Ele nos ensine. Que Ele nos ajude. E que possamos ser Seus verdadeiros embaixadores e representantes, fiéis e perseverantes, em amor, neste mundo. Para que Seu Nome seja glorificado. Que assim seja. Amém e amém.

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