“Sai depressa para as ruas e
becos da cidade e traze para aqui os pobres, os aleijados, os cegos e os coxos”
(Lucas 14.21)
Deus chamando para a Sua ceia. E
que texto sério este é. Porque, primeiro, Deus chama os “sãos”. E chama muitos.
Só que todos eram pessoas importantes e, por isso, na hora em que tudo já
estava preparado, eles precisam desculpar-se por não poder ir participar.
Afinal, havia tantas coisas para resolver: um campo recém comprado que
precisava ser visitado; cinco juntas de bois que precisavam ser experimentadas;
um casamento recém contraído que precisava ser desfrutado... Tão importantes...
tão ocupados... que não há tempo para ceias.
E, ao ler isso, meu coração se
enche de temor. Porque eu me vejo nisso. Nos vejo nisso. Nossa geração sempre
tão ocupada, com tantas coisas importantes para fazer. Tantas coisas para
estudar, tantas notícias novas para ouvir, tantos compromissos, tantas pessoas
importantes com quem falar, tantos eventos importantes para organizar, tanto
dinheiro para ganhar, tantas dívidas para pagar, tantos amigos para fazer... e
não nos tem sobrado tempo para ceias. Para a grande ceia de Deus. Mas, ela já
está pronta (v.16-17). O servo do dono da ceia já veio nos chamar para nos
achegar a ela. E o convite foi feito para tantos. Porém, todos eles tinham
coisas demais para resolver, e não ligaram para o seu convite.
E foi então que o dono da casa,
irado, disse ao seu servo para trazer para o jantar os pobres, os aleijados, os
cegos e os coxos. E assim ele o fez. E estes não negaram. E lá estavam eles
para a grande ceia daquele grande senhor. Por quê? Por um simples motivo: eles
sabiam-se necessitados. Sabiam-se pobres e doentes, e pessoas assim não negam
convites – muito menos para uma ceia. Eles sabem reconhecer bênçãos, quando
estas lhes são oferecidas. Eles sabem reconhecer que tem tão pouco e, diante
disso, tudo se torna tão grandioso e importante – quanto mais um convite feito
por um grande senhor.
E é aí que eu penso quem somos
nós. Os homens ocupados e importantes, ou os pobres e doentes. Como enxergamos
a nós mesmos? Como temos vivido as nossas vidas? Como pessoas grandes, a quem o
Grande Senhor oferece favores – os quais nos sentimos no direito de avaliar
para verificar se estes são mais ou menos importantes do que os nossos
compromissos? Ou como aqueles homens pobres, cegos, aleijados, coxos,
conscientes da sua pequenez diante daquele Grande Senhor, e do quanto
participar daquela Ceia lhes era um privilégio impagável? De fato, aqueles
homens necessitados nunca poderiam pagar por aquela ceia. Eles não tinham nada
a oferecer. E, talvez, exatamente por isso eles não negaram aquele chamado.
Infelizmente, costumamos nos
enxergar de uma maneira tão diferente do que realmente somos. Somos os homens
pobres, cegos e aleijados, sujos, mendigos, sem nada para oferecer a Deus. Mas,
tão facilmente acreditamos quando o mundo nos diz que somos grandes e
importantes, e que Deus precisa entrar na fila da nossa agenda, para ver onde
conseguimos encaixa-Lo. E o triste disso é que, no final desta parábola, o
senhor da grande ceia diz: “Porque vos declaro que nenhum daqueles
homens que foram convidados provará a minha ceia” (v.24). Uma vez que a
ceia tenha começado e o convite tenha sido negado, não há mais volta. A
oportunidade passou. E perdemos a coisa mais importante que poderíamos ter
recebido nesta existência.
Seguir a Jesus Cristo é um grande
privilégio, mas também tem exigências. Primeiro, o reconhecimento de quem, de
fato, somos: reconhecermo-nos pobres, cegos, coxos, aleijados. Necessitados.
Imerecedores. Sem nada para oferecer em troca, a não ser nossa presença – nossa
vida. Segundo, pagar o preço. Reconhecer que todos as nossas coisinhas, que
parecem tão grandes diante das lentes deste mundo, são ínfimas, sem valor,
diante do insondável valor de participar da ceia dAquele Senhor. Nada pode se
comparar a participar daquilo que Ele estava preparando. Nenhum de nossos
tesouros. Nem mesmo nossos campos, bois ou, ainda, casamentos. Nem mesmo nosso
desejo de afeição natural, pois assim diz o Senhor Jesus: “Se alguém vem a mim e não
aborrece a seu pai, e mãe, e mulher, e filhos, e irmãos, e irmãs e ainda a sua
própria vida, não pode ser meu discípulo”. Porque para seguir a Jesus é
necessária a consciência de que nosso maior tesouro é Ele. Maior do que
qualquer outro tesouro, por mais valioso que ele seja, que possamos ter nessa
vida – incluindo nossa própria vida neste corpo. Reconhecer nossa pequenez – e reconhecer
a grandeza dEle.
Por isso, é preciso calcular o
preço a ser pago para dizer esse “Sim” a Jesus. Um preço muitas vezes não
ensinado, não esclarecido. Mas o preço é grande, e é preciso que seja calculado
– assim como é necessário que se calcule a despesa para construir uma torre ou
a quantidade de soldados para vencer uma guerra (v.28-32). Para que não ocorra
que, tendo dito um sim inconsciente, venhamos a ser envergonhados. Seguir a
Jesus exige renúncia: de nosso orgulho, nossa reputação, nossos maiores
tesouros, nossa própria vida: “pois, todo aquele que dentre vós não renuncia a
tudo quanto tem não pode ser meu discípulo” (v.33).
Por isso o Reino é dos necessitados.
Porque quem é pobre, aleijado, cego e coxo facilmente enxerga que tudo aquilo
que ele venha a possuir nesta vida não pode se comparar ao que Aquele Senhor
lhe oferece. Aquela ceia. Por isso, sua resposta não poderia ser outra a não
ser “Sim!”. Ele olha para si mesmo e olha para Aquele Senhor, e entende. E,
para entrar no Reino de Cristo, é necessário que seja assim também. Que Ele
cresça, e nós diminuamos. Que reconheçamos quem somos e Quem Ele é. E, só
assim, compreenderemos como somos privilegiados por poder fazer parte disso.
Quando tivermos a consciência que somos os pobres, aleijados, cegos e coxos. E
Ele é o Rei. E a menor coisa que Ele possa nos oferecer ainda será maior do que
tudo o mais que possamos conquistar sem Ele. Assim, que nossa resposta seja
sim. E que participar do que Ele tem preparado seja a maior alegria dos nossos
corações. Que assim seja. Amém.
Nenhum comentário:
Postar um comentário